APARTAMENTO MARALUNGA, COBERTURA 660 m2

casa galeria de arte

Jornalista: Esta é uma casa de quem definitivamente aprecia arte!

Felipe Carolo: Muitíssimo. E este foi o meu maior desafio. Esta minha cliente é apaixonada por arte e tem um acervo muito grande de quadros, tapetes, máscaras. Ela adora viajar para lugares inusitados de onde traz muito conhecimento e souvenirs, muitos souvenirs. 

Além disso, é uma mulher de 80 anos que tem um extenso mobiliário afetivo com histórias de família, de gerações. E como você mexe em um lugar com tanta história? Com muito cuidado e muita responsabilidade.

Jornalista: Qual foi o pedido inicial deste projeto?

FC: O pedido inicial foram serviços de manutenção, como piso, coisas pequenas. E, a atualização da sala de TV, que a incomodava com um sofá em L e tecnologias que não a agradava. Desses pedidos, a obra cresceu para o living completo, lavabo, banheiro, escritório, quartos, varanda, jardim e a suíte de uma funcionária que também vive no apartamento. Suíte esta que estava com problemas de infiltração, vazamento. E aí, mais um desafio: eu tinha apenas 18 dias úteis para realizar todo o projeto. Ela iria viajar e, na volta, tudo deveria estar pronto. 

Jornalista: É realmente um tempo curto. Foi possível entregar neste prazo?

FC: Sim, e com todos os desejos e necessidades solucionadas. Foi muito corrido, desafiador, mas gratificante também. 

Jornalista: Mexer com tanta herança afetiva, como você disse, é uma grande responsabilidade. O que foi vetado de todas as maneiras aqui?

FC: Acho que vetado, quase nada. Mas a cliente sabia muito bem o que que queria o que não queria. Então, ela me deixou criar e depois me colocou o que não queria que tirasse de jeito nenhum. Um dos nãos foi mexer no quarto da neta, que eu havia feito há uns anos para ela. Ela e a menina adoram e não quiseram atualizar nada. 

Jornalista: Como foi solucionada a sala de TV?

FC: A sala de TV é o canto mais reservado da casa, onde a gente fica mais à vontade. E, sendo assim, parte fundamental desse espaço é o sofá. Quando descobri que a minha cliente não gosta de ver TV acompanhada e, enxerguei duas poltronas Maralungas lindíssimas, com pufes, um tanto esquecidas de canto, resolvi – por que mais do que essa poltrona que te abraça para ver um filme?  Revesti as duas em couro e as coloquei em diagonal para a televisão. Tirei o projetor que ela não gostava e troquei por uma TV no meio da sala, porque em frente à janela nunca é uma opção para mim. 

E havia muitos objetos pequenos, de colecionismo, pela casa. Escolhi, então, deixá-los na sala de TV em exposição dispostos em estantes finas e brancas. Além disso, dois quadros que ela gosta muito também foram para o espaço, incluindo um Volpi.

E, claro, a primeira coisa que eu fiz em todo o apartamento foi tirar o bege que estava deixando as paredes cansadas e pintá-las de branco para dar destaque a todas essas escolhas.

Jornalista: O que deu mais trabalho e, consequentemente tomou mais tempo?

  • Apesar da obra na suíte com o vazamento ser estrutural, as escolhas de decoração para o living, assim como para todo o restante da casa, partiram do ressignificar ao máximo o que já existia. E esse olhar foi algo cuidadoso e delicado. Eu estava em acervo repleto de mobiliário legal, assinado, porém, havia um excesso visual que eu precisava amenizar.  Procurei um caminho para deixar a casa mais leve e simultaneamente com a cara da moradora. 

Jornalista: Quais as principais escolhas para a sala de estar?

FC: Comecei também pelo sofá. Já havia um Maralunga de três lugares que a cliente gostava muito. Porém, ela quase não o via no tecido original, um crepe de seda, pois ficava sob capa para proteger das patinhas dos gatos e do cachorro. Procurei um tecido que fosse resistente e o revesti de ultrasuede marrom. Para o outro lado da sala, queria algo que conversasse com as memórias que a cliente tinha, quando viveu em Paris e, com a minha identidade dentro do meu momento design francês. Desenhei um sofá curvo, off white, no mesmo tecido.

  • da italiana Cini Boeri, já estava ali e ali permaneceu no melhor lugar que havia para ela. Então, precisava de mais duas poltronas. Escolhemos uma do Jorge Zalszupin, com base em ferro preto, e uma Sérgio Rodrigues, com a base em madeira. A mesa de centro é da Jacqueline Terpkins e as mesas soltas para atender em dias de receber também são do Jorge Zalszupin. 

    Como ela gosta de ler o jornal e tomar o café ali, coloquei a luminária BS2 da Mantis, por Bernard Schottlander. O revisteiro é de 1900, herança de família, e foi da avó dela. Foi devidamente restaurado e exposto em evidência, porque é uma peça que merece destaque dentro desse grande acervo afetivo.

    A cristaleira de jacarandá, outro móvel com história ali, recebeu toda a prataria e objetos decorativos clássicos que ficaram em exposição com as portas do móvel abertas.

as escolhas de decoração para o living, assim como para todo o restante da casa, partiram do ressignificar ao máximo o que já existia. E esse olhar foi algo cuidadoso e delicado.

Jornalista: Como foi o processo de curadoria das obras de arte?

FC: Entre máscaras e quadros, pendurei 160 peças. Foi um processo mesmo de catalogar uma a uma e escolher quais ficariam em destaque.

Salvador Dalí, Iolanda Mohalyi, Gustavo Tozzi, Volpi, Silvion Oppenheim, Carybé, Alberto Guinard, Manabu Mabe eram alguns dos nomes que eu precisei selecionar. A coleção de máscaras de diferentes origens também é vasta. A maioria foi para o escritório e as principais para as salas. 

Criei uma galeria no corredor no segundo hall do apartamento com boiserie para acompanhar o estilo clássico e elegante do desenho do piso, marcado em três tipos de mármore. A iluminação com olho de moscou destaca ainda mais as obras e tapeçarias distribuídas nas paredes. Uma delas, uma peça de reza muçulmana com mais de 80 anos, foi enquadrada para proteger dos efeitos do tempo. Quem passa pela casa sabe que ali vive uma pessoa que tem muito a dizer sobre arte do mundo todo. 

No hall social, optei por uma mistura do clássico com algo mais contemporâneo – coloquei um banco de folha de cobre de madeira, bem discreto, para apoio, e a luminária da Mel Kawahara também com a boiserie. Tudo branco, com jeito de galeria mesmo.

Jornalista: E os quadros do lavabo?

FC: O lavabo foi atualizado com uma torre de mármore Golden Spider, branco com veio em dourado, lindíssimo, bem elegante. Fiz alguns vidros meia-lua onde coloquei as obras do pintor Mucha, em estilo Art Nouveau. E fiz uma brincadeira. Quando você entra no lavabo, só vê as obras pelo espelho. Uma vez dentro do espaço, você está de frente para os quadros de 1,15m x 0,50cm. Estão escondidos, mas não estão.

Jornalista: A sala de jantar tem uma composição muito interessante. 

FC: O móvel principal aqui é a mesa de jantar, que foi da mãe da moradora, com oito cadeiras Thonet de palhinha, que ela ama. Essas cadeiras são clássicas, porém, quando tonalizam a madeira, elas ganham um tom amarelado. Como escolhi o lustre em preto da Lina Bo Bardi, mais moderno queria deixar também as cadeiras em preto. Mas ela não gosta de preto nem de dourado. Então, restaurei a madeira e as deixei no tom original.

Saíram o crepe de seda com voal das cortinas e entrou o linho branco com o varão preto. Tirei o aparador solto de vidro que existia antes e troquei por um fixo, suspenso, de madeira bem clarinha do Bruno Rangel para a Dpot, em carvalho americano, bem claro. Posicionei os quadros, claro, tendo como direção os artistas e obras mais importantes para ela. 

O centro de mesa é do Domingos Totora, designer que trabalha com papel reciclado e barro, algo mais contemporâneo para entrar nessa mistura de estilos e materiais.

Entre máscaras e quadros, pendurei 160 peças. Foi um processo mesmo de catalogar uma
a uma e escolher quais ficariam em destaque.

Jornalista: Os tapetes são todos de colecionismo?

FC: Todos. E sendo uma coleção especial para a moradora, de anos e de muitas histórias de viagens e de família, decidi expor muitos deles. No living usei tapetes que estavam guardados e o escritório ganhou diversas peças em tamanhos diferentes.

O pedido para o escritório que também é biblioteca, aliás, foi uma nova iluminação. Trouxe, então, os lustres que ficavam na sala de jantar junto de uma ousadia moderna de fios de LED no teto. É um espaço de trabalho, que pede muita luz.

Da sala de estar também veio o sofá Maralunga de dois lugares que ficou em um canto mais reservado para leitura. 

Jornalista: Há serviço de curadoria Felipe Carolo neste projeto?

FC: Sim. As camas ganharam roupa novas pensadas nos hábitos de quem vive a casa e no gosto por tecidos étnicos jogados por cima, por exemplo. Usei duvet de linho dupla face, um lado verde claro e do outro lado verde escuro. Um lado terracota, do outro lado rosé. De um lado verde, do outro lado verde claro. Cinzinha com cinzinha listrado. Eu fiz esse jogo pensando exatamente no que pode vir por cima, caso ela queira um tecido com memória, como adora trazer das viagens.

Além disso, refiz a iluminação e coloquei uma estante para livros no lugar da cômoda que não atendia mais o volume dos exemplares. 

Jornalista: O que foi alterado no jardim?

FC: O primeiro não para o jardim foi a mudança de estilo do paisagismo assinado por Gilberto Elkis. A moradora ama um jardim clássico estilo europeu e foi assim que mantivemos. O projeto, assinado pelo Studio Clariça Lima, tirou os vasos altos de cerâmica, o excesso de pergolado de madeira, e substituiu por vasos mais lineares e mais baixos de fibra de vidro, leves e no tom off white.

Na área externa da piscina, no lugar do pergolado de madeira, que abrigava um suculentário já sem vida e com mobiliário sem muito uso, trocamos por um pergolado leve, de aço carbono com vidro e um suculentário completamente novo. Os móveis novos são confortáveis e compatíveis com o estilo de vida da moradora. 

fotos: Ruy Teixeira

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